#Estrutura da Terra: A Estrutura Interna da Terra e a Geofísica - Sobre Geologia

06/08/2017

#Estrutura da Terra: A Estrutura Interna da Terra e a Geofísica

Dando continuidade da série Estrutura da Terra, iremos abordar neste artigo a Estrutura Interna do Planeta Terra. Para isso, torna-se interessante abordar também algumas noções da geofísica. 

Diagrama com as camadas internas da Terra.
Por Original Mats Halldin Vectorization: Chabacano -
File:Jordens inre.jpg, CC BY-SA 3.0,
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1659604
Antes de começarmos, caso não tenha visto os artigos anteriores, clique nos links abaixo, pois estas leituras são muito importantes para uma melhor compreensão!


 Introdução


Os geólogos sempre tiveram um grau de limitação em relação aos estudos sobre o interior da Terra: Como estudar algo tão grande e tão inacessível aos humanos? 

Uma só palavra reponde essa pergunta: Geofísica!

Graças a esta ciência, os geólogos podem elaborar teorias, realizar experimentos em laboratório e criar modelagens computacionais com base nos dados e informações coletadas pelos profissionais dessa área.

Por isso a geologia e a geofísica caminham lado a lado no desenvolvimento científico das geociências. 

O Sismógrafo é um instrumento geofísico capaz
de medir as vibrações causadas por ondas sísmicas,
e foi através dele que as primeiras teorias sobre o
interior da Terra foram elaboradas. Autor:
José Eduardo Madeira Celeiro
Diniz Rebelo Domínio público,
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=551268

Geofísica


Antes do surgimento da geofísica(por volta de 1830), todo o conhecimento dos geólogos era baseado puramente na observação concreta e especulações baseadas na filosofia natural que em muitas das vezes se confundiam com explicações divinas.

Por volta do século XVIII, as atividades mineradoras da época cresciam em uma razão de profundidade na qual era possível realizar observações científicas sobre o interior da Terra e o aumento da temperatura em função da profundidade, e isso criou uma hipótese entre os cientistas da época de que ao atingir os 80 km abaixo da superfície, todas as rochas ali presentes estariam totalmente fundidas, formando um "mar" de magma pelo qual os vulcões se abastecem. 

Contudo, anos mais tarde os geocientistas descobriram que essa conclusão errônea se devia à falta de conhecimento dos mesmos quanto as propriedades físicas da Terra. Foi então que iniciaram-se os estudos da "Física da Terra", que posteriormente se transformou em geofísica.

Os Métodos Geofísicos


Com o surgimento da geofísica, os geólogos da época poderiam se basear nos inovadores "métodos geofísicos". Como o nome sugere, basicamente são métodos, procedimentos e modelos físicos que são aplicados ao estudo das propriedades físicas da Terra, como o magnetismo, gravidade, calor, ondas elásticas, radioatividade e a eletricidade. E cada propriedade dessa possui seu respectivo método geofísico para ser estudada. Os métodos geofísicos e suas propriedades correspondentes estão relacionados na tabela abaixo.

Os métodos geofísicos e suas respectivas
propriedades físicas relacionadas.

Para o estudo do interior da Terra e sua estruturação, o método mais utilizado é o sísmico, no qual ondas elásticas artificiais(geralmente geradas por uma explosão) são emitidas no interior da Terra com equipamentos de monitoração que mediram o tempo, a distância e o caminho percorrido pelas ondas. E conhecendo-se o comportamento dessas ondas em determinados meios, é possível obter um modelo geofísico daquilo que não podemos enxergar. E foi por meio de vários estudos como esse que foi estabelecido o modelo do interior da Terra mais aceito atualmente, e é esse modelo que vamos estudar agora.

Estrutura Interna da Terra


O nosso planeta possui uma configuração interna em camadas, que são classificadas com base em seus aspectos físicos e químicos. Essa disposição estratificada é resultante da diferenciação magmática, processo no qual ocorre a variação de composição de um magma inicial, originando vários tipos de rochas, através de outros processos como cristalização fracionada, imiscibilidade de líquidos e fracionamento de líquido magmático. (WINGE, Glossário Geológico CPRM

A diferenciação magmática(ou fracionamento magmático) e seus processos constituintes serão abordados com maior detalhamento nos próximos artigos da série, pois estes processos promovem uma grande variedade de magmas e rochas, sendo, portanto, um mecanismo fundamental para a atual estruturação da Terra.


O planeta Terra possui dois tipos de camadas: as externas e internas. Cabe a geologia e a geofísica estudar as camadas internas, enquanto que as camadas externas, que abrigam os efeitos climáticos e a vida na Terra são mais estudados por outras ciências, como a Biologia, a Meteorologia, Climatologia, etc. A imagem abaixo demonstra a divisão da Terra com os dois tipos de camadas para que vocês possam saber quais são as camadas externas e internas. As camadas externas constituem o que denominamos de Atmosfera, lugar o qual estamos inseridos neste momento.

Zonas de Descontinuidade


Como dito anteriormente, o método mais comum utilizado pelos geofísicos e geólogos para o estudo do interior da Terra, é o uso de ondas sísmicas(naturais ou artificiais), que com base nas velocidades de cada tipo de onda(ondas P e S) e o comportamento de cada um delas em diferentes camadas da Terra, é possível estabelecer um modelo geofísico e geoquímico.

Neste modelo estão localizadas as Descontinuidades: zonas existentes entre as camadas internas da Terra e que delimitam tais camadas por meio de uma fase de transição de propriedades físicas e químicas entre as mesmas, resultando em uma mudança abrupta na velocidade das ondas sísmicas ao percorrerem essas áreas. Cada descontinuidade é nomeada em homenagem ao seu descobridor. Ao longo da profundidade do planeta, existem ao todo 5 principais descontinuidades até então conhecidas, que serão dispostas na imagem abaixo, e são elas:

  • Descontinuidade de Conrad;
  • Descontinuidade de Mohorovicic;
  • Descontinuidade de Repetti;
  • Descontinuidade de Gutenberg;
  • Descontinuidade de Lehmann.

Modelo Geofísico X Modelo Geoquímico


É importante frisar que a Estrutura Interna da Terra, como dito anteriormente, é dividida em duas classificações que dão origem aos modelos geofísico e geoquímico:

  • Classificação Geofísica ou Dinâmica: baseia-se nas propriedades físicas dos materiais, como densidade, velocidade de propagação de ondas, etc. e é dividida nas seguintes camadas:
    • Litosfera: Sólida e Rígida. Possui espessuras que variam de 5 km a 100 km em regiões montanhosas(orógenos). A litosfera pode ser definida como sendo uma camada superficial fria, móvel e com rigidez, resistindo a esforços da ordem de até 1 kbar durante intervalos de tempo superiores a 109 anos. A interface entre a litosfera e a astenosfera é definida por uma isoterma (superfície de temperatura constante) de aproximadamente 1.200 ºC. As rochas que se situam acima desta isoterma são suficientemente frias para comportarem-se rigidamente, enquanto que aquelas que se situam abaixo da isoterma deformam-se plasticamente. A litosfera pode ser comparada como a "casca" da Terra, por ser tão fina em relação as dimensões totais do planeta. (SOARES, Leila. IAG-USP)
    • Astenosfera: Sólida e Pouco Rígida(dúctil). A astenosfera é a camada que se situa logo abaixo da litosfera. Como sua temperatura é mais elevada, possui menor rigidez sofrendo deformação quando sujeita a esforços. A rigidez da astenosfera é tal que ela pode ser considerada como um fluido  viscoso para longos períodos (tempo geológico, milhões a bilhões de anos) e como um sólido elástico para curtos intervalos de tempo, como por exemplo, para a passagem das ondas sísmicas (minutos a segundos). (SOARES, Leila. IAG-USP)
    • Mesosfera: Sólida. A mesosfera é a região situada abaixo da astenosfera, sendo caracterizada por apresentar alta viscosidade, ocasionada pelo aumento da pressão com a profundidade, que dificulta movimentos de convecção. Devido aos elevados valores de viscosidade, existem modelos que admitem a existência de células de convecção independentes, mas teorias baseadas em processos de convecção no manto como um todo também não são totalmente descartadas. (SOARES, Leila. IAG-USP)
    • Endosfera: Líquida(núcleo externo) e Sólida(núcleo interno). A Endosfera é região central da Terra, situada logo abaixo da mesosfera. A interface núcleo externo/núcleo interno ocorre a cerca de 5.200 km de profundidade, sendo marcada pela Descontinuidade de Lehmann. O processo de geração do campo magnético terrestre ocorre no núcleo externo. (SOARES, Leila. IAG-USP)
    • Classificação Química ou Estática: baseia-se na composição química dos materiais, e é dividida nas seguintes camadas:
      • Crosta Continental: Composta de Silício, Oxigênio, Alumínio.  A crosta continental é dividida em crosta continental superior, com espessuras entre 10 e 30 km e composição química bastante variada, sendo composta de rochas ígneas sedimentares com baixo grau de metamorfismo, e crosta continental inferior, cuja composição é menos conhecida mas basicamente infere-se que são rochas metamórficas, chegando a profundidades de 35 km em média. A densidade da crosta continental varia entre 2,65 - 2,8 g/cm3. É delimitada inferiormente pela Descontinuidade de Conrad. (IAG-USP)
      • Crosta Oceânica: Composta de Silício, Magnésio, Cálcio. Apresenta espessuras entre 5 - 8 km e é mais densa (3,0 - 3,1 g/cm3) do que a crosta continental. A rocha típica da crosta oceânica é o basalto. Ela é relativamente mais delgada do que a crosta continental. (IAG-USP)
      • Manto: Composta de Magnésio, Ferro, Silício. Divide-se em:
        • Manto Superior: O manto superior inicia sob a crosta oceânica a uma profundidade média de 6 km e sob a crosta continental a uma profundidade média de 35 km, atingindo profundidades de até 400 km. A descontinuidade entre a crosta e o manto é denominada Descontinuidade de Mohorovicic. O modelo mais aceito para sua composição química atualmente é baseado no peridotito, que é uma família de rochas ultrabásicas tipicamente compostas por olivina magnesiana (aprox. 80%) e piroxênio (cerca de 20%). Essas rochas ocorrem em cinturões de montanhas dobradas, ilhas oceânicas e em kimberlitos(Trata-se de um peridotito, muito comum na região de Kimberley, na África do Sul, onde é feita a extração de diamantes, sendo considerada a rocha matriz deste mineral [BRAZ, Fábio]). (IAG-USP)
        • Manto Transicional: localizado a cerca de 400 a 650 km de profundidade, essa região apresenta uma série de transições de densidade e mineralógicas de origem ainda não definida, sendo limitada inferiormente por uma das mais complexas descontinuidades - a Descontinuidade de Repetti¹.
        • Manto Inferior: Composto predominantemente de silicatos ferromagnesianos com estrutura densa e, em menor quantidade, por silicatos cálcio-aluminosos, e óxidos de magnésio, ferro e alumínio. Por constituir um grande volume do planeta, um mineral que é encontrado nessa camada, a Perovskita, é provavelmente o mineral mais abundante da Terra. (TEIXEIRA, Wilson et. al, 2009)

          A densidade nesta região aumenta linearmente de 4,6 g/cm3 até 5,5 g/cm3. Aparentemente nenhuma mudança de fase importante ocorre no manto inferior, apesar de ocorrerem pequenos gradientes de velocidade em 1.230 e 1.540 km. Desta forma, acredita-se que o aumento na velocidade deve ocorrer principalmente como resultado da compactação de um material de composição uniforme.
      • Núcleo Externo: O núcleo externo possui cerca de 30% da massa da Terra, e deve ser homogêneo devido aos movimentos de convecção. Os valores de densidade são conhecidos com melhor exatidão. Dados de ondas de choque para pressões de aproximadamente 1,4 Mbar mostram que o ferro puro possui uma densidade de aproximadamente 10,6 g/cm3. Desta forma, o ferro puro é muito denso para ser o único constituinte do núcleo externo, necessitando de um elemento menos denso para fazer parte da liga. Existem potencialmente quatro elementos químicos menos densos que o ferro, suficientemente abundantes na Terra, que poderiam constituir esta liga: Silício, Oxigênio, Magnésio e Enxofre. Segundo estudos recentes, os mais prováveis são o Silício e o Enxofre.
      • Núcleo Interno: Composto de Ferro e Níquel. O núcleo interno compreende somente 1,7% da massa da Terra e a sua densidade é conhecida apenas de modo aproximado, sendo os resultados obtidos através de experiências com ondas de choque em pressões da ordem de 3,6 Mbar. Estes experimentos demonstraram que a densidade do núcleo interno é muito elevada para o ferro puro. Assim, foi preciso realizar um estudo a fim de determinar qual elemento deveria fazer liga com o ferro de modo a explicar os dados experimentais. Por analogia com meteoritos sideríticos(meteoritos compostos por uma liga de elementos metálicos) chegou-se à conclusão de que este elemento deveria ser o níquel. Acredita-se que a quantidade de níquel presente no núcleo interno seja da ordem de 10 a 20%.

    Diagrama Geral

    A imagem abaixo é um diagrama que demonstra a disposição e profundidade de cada camada, no intuito de ilustrar a estrutura que acabamos de descrever.

    Diagrama de disposição, profundidade e características das camadas internas da Terra,
    na classificação Geofísica(A) e Geoquímica(B). Fonte: https://goo.gl/P5LFTP. Figura sem escala.

    Nos próximos artigos da série, os métodos geofísicos, mais detalhes sobre a diferenciação magmática, a distinção das ondas P e S  e muitos outros temas pertinentes ao assunto, serão abordados com maior detalhamento, para que este artigo não fique sobrecarregado de conteúdo.

    Abaixo, um vídeo do canal Nerdologia, explicando um pouco sobre o interior da Terra, os métodos geofísicos e outros temas como a exploração petrolífera irão ajudar na compreensão do assunto.



    Errata: em 1 minuto e 57 segundos, é dito que o manto é composto por rochas derretidas(magma), o que não é verdade. As rochas do manto, como explicado acima, podem ser dúcteis, mas não a ponto de serem um fluido! 

    Referências

    • TEIXEIRA, Wilson et. al, Decifrando A Terra, 2ª Ed. São Paulo, Companhia Editora Nacional.
    • http://www.iag.usp.br/geofisica/graduacao/content/o-que-%C3%A9-geof%C3%ADsica. Acessado em 06/08/2017.
    • ¹) http://www.fgel.uerj.br/dgrg/webdgrg/HOMEPAGEOCEANO/GG6_Estrutura%20da%20Terra.html. Acessado em 06/08/2017.
    • www.iag.usp.br/~eder/apostila/COMO_NASCEU_A_GEOFISICA. Acessado em 16/04/2017. Acessado em 06/08/2017.
    • http://www.iag.usp.br/siae97/geofs/. Acessado em 06/08/2017.
    • http://www.iag.usp.br/siae98/aterra/dinamica.htm. Acessado em 06/08/2017.
    • https://en.wikipedia.org/wiki/Transition_zone_(Earth). Acessado em 06/08/2017.
    • https://pt.wikipedia.org/wiki/Metal#Rela.C3.A7.C3.A3o_dos_metais_existentes. Acessado em 06/08/2017.
    Escrito e editado por Rafael Ladeia.

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