Geologia Marinha - Uma breve introdução - Sobre Geologia

25/06/2018

Geologia Marinha - Uma breve introdução

Ainda que aproximadamente 70% da superfície terrestre seja recoberta por água, pouco se sabe sobre os oceanos. Fora as grandes profundidades inexploradas e a flora e fauna ainda por serem descobertas, não é apenas isso que guardam nossos oceanos. Desse modo, com uma união entre os estudos da geologia e das nossas áreas oceânicas, costeiras e marinhas, temos o que é chamada de Geologia Marinha — a especialidade geológica sobre a qual falaremos hoje!

Uma fotografia do complexo ecossistema marinho e sua paisagem. Foto por: Christopher Robinson.

Introdução

A Geologia Marinha é uma ramificação da geologia, desenvolvida para focar seus estudos em fundos oceânicos e marinhos, zonas costeiras, e mesmo alguns lagos e estuários. Através dos conhecimentos da oceanografia, geologia e, em alguns casos, da biologia, foi possível edificar uma ciência e desenvolver estudos que traziam descobertas à respeito da própria mecânica da Terra.
Mesmo os geólogos mais antigos se perguntavam qual seria a aparência dos fundos oceânicos caso não houvesse água os recobrindo. Segundo o Serviço Geológico do Estados Unidos (USGS), geólogos no início do século XIX, por exemplo, acreditavam que, no fundo dos oceanos, se encontraria apenas uma camada plana de lama — algo que, hoje sabemos, não é verdade.
Durante a Segunda Guerra Mundial, houve um desenvolvimento muito maior dos estudos dos relevos oceânicos. Foram projetadas tecnologias muito mais avançadas, que tinha intenção de identificar mais facilmente submarinos nos fundos dos oceanos.
As crostas oceânicas costumam ter menores espessuras que as crostas continentais, numa faixa de 5 a 10km. Sua composição é formada principalmente de rochas basálticas e gabroicas, ricas em cálcio e ferro, e silicatos magnesianos. Devido à sua composição rica em ferro, essas crostas são mais densas que crostas continentais — por isso, em zonas de colisão entre elas, as oceânicas passam pelo processo de subducção, dando continuidade aos processos de tectonismo.

A Importância de Geologia Marinha

Como mostramos no artigo "A Teoria da Tectônica Global", as placas oceânicas são uma parte muito importante dos processos ocorridos a todo momento na tectônica global, sendo constantemente destruídas e reconstruídas, de acordo com os movimentos divergentes e convergentes das placas.
Os estudos nos fundos dos oceanos foram de uma contribuição essencial para a fundamentação da Teoria da Tectônica Global. No fim dos anos 1940 e início da década seguinte, expedições comandadas principalmente por pesquisadores das universidades de Princeton e Columbia (EUA) mapearam e coletaram amostras do fundo do oceano Atlântico. Esses trabalhos permitiram mapear as Cadeias Meso-Oceânicas, um sistema que chegava a alcançar 84.000 km e apresentando uma largura na escala de 1.000 km. Além disso, nessa dorsal, se encontrou a presença de vales num intervalo de 1 a 3km, apontando à presença de rifte — assim, um regime tensional. Também se constatou temperaturas maiores nas rochas da dorsal meso-oceânica que no resto das placas oceânicas, sendo uma região de forte atividade vulcânica e sísmica. Se a dorsal, de fato, dividisse a crosta oceânica em duas, seria um ponto forte à favor da teoria da deriva continental.
À partir da década de 1950 e 1960, com o desenvolvimento tecnológico e da geocronologia, foi possível provar que a teoria de que as rochas do fundo oceânico são as mais antigas da Terra estavam erradas. Na verdade, costumavam apresentar idade bem mais jovens, não ultrapassando 200 milhões de anos. Desse modo, mais uma vez, os estudos da geologia dos oceanos ajudavam a desenvolver as teorias mais básicas da nossa ciência.


Distribuição das idades geocronológicas em milhões de anos, mostrando as rochas mais jovens estando mais próximas à dorsal meso-oceânica do Atlântico Norte. Fonte: Decifrando a Terra.
Além disso, esses estudos são, há décadas, muito relevantes, para a extração e beneficiamento de recursos minerais, conhecimentos sobre seu próprio domínio territorial, expansão marítima e até mesmo para  a biologia — pois o ambiente é um fator indispensável para a análise de uma espécie.

Relevo Oceânico

A morfologia das crostas oceânicas é uma importante base de estudos da geologia marinha e oceanografia. A posição da área de estudos influencia diretamente no tipo de rochas encontradas, entre outras informações que podem ser importantes para a exploração de petróleo, por exemplo, quando falamos das bacias oceânicas.
Fonte: Tom Garrisson (2010).
Podemos dividir o relevo oceânico em algumas categorias:

As plataformas continentais correspondem às porções do fundo oceânico que margeiam os continentes, começando na linha da costa e se estendendo até, aproximadamente, 200m. Costumam ser bem planas, com baixa declividade — por isso "plataformas" continentais —, e possuem larguras variáveis. Segundo o Serviço Geológico Nacional do Brasil (CPRM), essas larguras podem variar de 70 a 80km, podendo alcançar até centenas de quilômetros. Por exemplo, as plataformas de oceanos como o atlântico, onde as margens são passivas, essas larguras costumam ser maiores.
Essas plataformas costumam ser de extrema importância para a exploração de recursos minerais, pois acumulam sedimentos carregados pelo vento, rios e até mesmo geleiras, em alguns casos. No Brasil, por exemplo, são muito importantes para a extração de petróleo e para o ecossistema do mar, pois, nessas regiões, os raios solares atingem todo o fundo marinho, promovendo luz para a fotossíntese de plantas e outros microorganismos.

Os processos de transporte e deposição de sedimentos no meio marinho. Fonte: Decifrando a Terra (2009)


O talude continental, ou vertente continental, é região com inclinação mais acentuada do relevo continental — segundo a CPRM, aproximadamente 1m de declive para cada 40m de extensão —, e se estende até as chamadas planícies abissais. Pode ser considerada uma faixa de transição, e não possui um relevo regular, podendo apresentar vales e até mesmo cânions.
Devido à sua alta declividade, apresentam o que chamamos de correntes de turbidez, uma corrente densa de sedimentos variados que pode ser comparada à uma avalanche debaixo d'água. A constante deposição no lado da plataforma, associada à erosão com os vales, cânions e inclinação do talude acabam por gerar uma instabilidade, que faz com que pacotes inteiros de sedimentos deslizem ou desabem em rolamento. Essas correntes dão origem a novas rochas muito características, os turbiditos. Dependendo da forma como o pacote de sedimentos desceu o talude, é possível observar uma sequência de deposição de sedimentos finos a médios (geralmente areias e argilas), com estratificação rítmica.

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Turbiditos.  Foto por: Brian Romans.

Na base dos taludes, encontramos os sopés continentais — elevações de declinação intermediária entre a da plataforma continental e a do talude. Elas se estendem entre 3000 e 5000m de profundidade, e a maior parte dos sedimentos que a compõem são de origem continental. Essa associação de plataforma, talude e sopé são chamados de margem continental, embora sua maior parte esteja submersa.
Já a região mais distante do continente é a chamada planície abissal. Essas áreas são extensas e profundas, de topografia aproximadamente plana, geralmente com mais de 4000m de profundidade. Elas começam no fim da elevação continental, e se estendem até os relevos íngremes das cordilheiras oceânicas. Os raios solares não alcançam o fundo das planícies, por isso, as temperaturas são muito baixas e as formas de vida são adaptadas à falta de luz. Essas regiões são interrompidas em algumas localidades por séries de montes e montanhas submarinas — elevações isoladas que podem alcançar até 1000m de altura.
Além disso, temos as chamadas fossas oceânicas — uma importante feição presente nas zonas de subducção das placas. As fossas constituem depressões alongadas e estreitas, com laterais de alta declividade. Atualmente, a fossa mais profunda já registrada é a Fossa das Marianas, descoberta em 1960, com 10920m de profundidade — ou seja, tem mais metros em profundidade do que o Monte Everest, maior montanha do mundo, tem em metros de altura (aproximadamente 8850 metros).
Observa-se também, no limite das planícies abissais, as cordilheiras oceânicas. São feições longas, fraturadas, escarpadas e construídas pelos processos vulcânicos e tectônicos de movimentação das placas. As regiões centrais dessas cordilheiras correspondem às regiões de maior atividade tectônica dos fundos oceânicos atuais, com fraturamentos e intrusão de diques de basalto, além de atividades hidrotermais. As partes emersas dessas montanhas são também chamadas de ilhas oceânicas, como o arquipélago de Fernando de Noronha, por exemplo.

Vista aérea da ilha Trindade (foto: Simone Marinho/commons.wikimedia.org)
Ilha da Trindade — ilha localizada no Oceano Atlântico, considerada parte do território brasileiro. Hoje, é utilizada como base militar da marinha. Foto: Simone Marinho/commons.wikimedia.org

Baía dos Porcos, em Fernando de Noronha, Pernambuco
Baía dos Porcos, no arquipélago Fernando de Noronha - Pernambuco. Foto por: Alex Uchoa

Conclusão

Os estudos da geologia marinha, embora tendo começado a menos de um século, têm sido extremamente relevantes para a nossa sociedade. Tendo avançado de conhecimentos de guerra para embasamento científico para extração de petróleo, por exemplo, esse ramo da geologia se edificou no campo da ciência e nos trouxe mais conhecimento sobre a Terra e seu funcionamento como um todo. O ser humano começou sua jornada pelo espaço, mas, infelizmente, ainda sabemos muito pouco sobre nossos próprios oceanos — e, talvez, através da geologia marinha e dos avanços tecnológicos, isso possa mudar!



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Referências

https://www.usgs.gov/faqs/what-marine-geology-0?qt-news_science_products=0#qt-news_science_products
https://walrus.wr.usgs.gov/pubinfo/margeol.html
TEIXEIRA, Wilson. FAIRCHILD, Thomas Rich. TOLEDO, M. Cristina Motta de. TAIOLI, Fabio. Decifrando a Terra - 2a edição. Companhia Editora Nacional. São Paulo. 2009
http://www.cprm.gov.br/publique/Redes-Institucionais/Rede-de-Bibliotecas---Rede-Ametista/Canal-Escola/Estrutura-Interna-da-Terra-1266.html
http://www.cprm.gov.br/publique/Redes-Institucionais/Rede-de-Bibliotecas---Rede-Ametista/Canal-Escola/Relevo-Oceanico-2624.html
http://sigep.cprm.gov.br/glossario/verbete/corrente_de_turbidez.htm
http://sigep.cprm.gov.br/glossario/verbete/turbidito.htm
http://sigep.cprm.gov.br/glossario/verbete/planicie_abissal.htm
https://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/relevo-submarino-plataforma-talude-e-outras-unidades.htm


Artigo escrito por Isabela Rosario

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