A província mineral do Quadrilátero Ferrífero (MG) - Sobre Geologia

22/12/2019

A província mineral do Quadrilátero Ferrífero (MG)

A região do Quadrilátero Ferrífero, no estado de Minas Gerais, é uma das áreas mais exploradas pela mineração no Brasil, tendo grande importância na economia do país em razão da sua riqueza em recursos como ouro e ferro. Essa província mineral faz parte da história da mineração no Brasil desde o ciclo do ouro, tendo começado pelo final do século XVII, com expedições em busca de ouro e prata. Desde a descoberta do ouro até os dias de hoje, a província é a área que abriga a maior concentração urbana do estado de Minas Gerais. No artigo de hoje, falaremos sobre essa tão importante região minerária do Brasil, sua história e características.



O Quadrilátero Ferrífero tem, aproximadamente, 7000 km² de área, localizado na porção centro-sudeste do estado de Minas Gerais. O nome característico foi primeiro utilizado em 1923, pelo geólogo Luiz Flores de Moraes Rego, em razão da morfologia da região. Em seu artigo "As jazidas de ferro de Minas Gerais", ele cita: "É no centro de Minas, no quadrilátero que tem por vértices Belo Horizonte, Santa Bárbara, Congonhas e Mariana, que a série Minas tem maior desenvolvimento" (Morais, 1923 apud Silva, 2010).
A geologia da região é intensamente estudada há anos devido a sua participação na economia brasileira, e é descrita por Barbosa & Rodrigues (1967) como um bloco de estruturas pré-Cambrianas, elevadas nos quatro lados por erosão diferencial. Na região, encontram-se diversas serras, como o início da Serra do Espinhaço, a Serra da Moeda, a Serra do Ouro Branco, entre outras.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), em 2009, "Das 1.950 toneladas medidas e indicadas como reservas de ouro no Brasil, que representam 4,5% das reservas mundiais do minério, quase a metade, cerca de 936 toneladas, está em Minas Gerais". Além disso, segundo o U.S. Geological Survey (2012), o Brasil seria o segundo maior exportador de ferro do mundo. Muito desse fato se deve não somente à quantidade de reservas do país, 29 bilhões de toneladas (em comparação aos 180 bilhões de toneladas mundiais), mas ao teor de ferro presente nesse minério: os minérios de Hematita, com 60% de ferro, predominante no Pará, e do tipo Itabirito, com 50% de ferro, predominante no estado de Minas Gerais — especialmente do Quadrilátero Ferrífero. Desse modo, Minas Gerais é líder em produção de ferro no Brasil, com 67% da produção no ano da pesquisa. Além disso, abriga vastas reservas de calcário, bauxita, manganês, argila, caulim, etc.

Dados de produção em milhões de toneladas de minério de ferro, no Brasil e no mundo. Fonte: USGS, 2012, extraído de IBRAM (2012)

Contexto Geológico

Posição estimada dos blocos arqueanos no início
da colisão, com sentido e direção do movimento.
Fonte: Barbosa e Sabaté, 2003.
A província mineral do Quadrilátero Ferrífero está localizada na borda sul do Cráton do São Francisco (Almeida 1977). Trata-se da mais bem exposta e estudada unidade tectônica do embasamento da plataforma sul-americana (BARBOSA et al, 2003), que abrange principalmente os estados da Bahia e Minas Gerais. É uma crosta antiga, pré-Cambriana, originada de um processo chamado de Colisão Paleoproterozoica (entre 2.5 bilhões  e 1.6 milhões de anos), quando quatro grandes blocos arqueanos (entre 3,85 e 2,5 bilhões de anos) colidiram: os blocos Jequié, Gavião, Serrinha e Itabuna-Salvador-Curaçá.
Em geral e de forma (muito) simplificada, as rochas encontradas no Cráton são terrenos metamórficos de alto grau, gnaisses, granitoides e granulitos, e associações do tipo granito greenstone. No Cráton, se destacam destacam três principais conjuntos de rochas pré-cambrianas: Associação Pré-Espinhaço, Supergrupo São Francisco e Supergrupo Espinhaço, sendo esse último de importância para a geologia do Quadrilátero.


De acordo com (Dorr 1969) apud Serviço Geológico do Brasil (CPRM), a geologia do Quadrilátero Ferrífero envolve três grandes conjuntos de rochas:

  • Um complexo metamórfico basal;
  • As supracrustais do Supergrupo Rio das Velhas;
  • Sequências metassedimentares paleo e mesoproterozoicas,  representadas pelo Supergrupo Minas, Grupo Sabará, Grupo Itacolomi e Supergrupo Espinhaço.
Mapa geológico simplificado de proposta do Geoparque Quadrilátero Ferrífero. Fonte: CPRM.

O complexo metamórfico basal tem idade arqueana, com rochas cristalinas que variam de gnaisses, de composição tonalítica a granítica, até  granitos, granodioritos, anfibolitos e meta-ultramafitos, gerados no Arqueano e remobilizados nos eventos proterozoicos. Já o Supergrupo Rio das Velhas apresentas greenstone belts, com rochas metavulcânicas e metassedimentos, incluindo formações ferríferas.  Segundo Dorr (1969), as rochas dessas unidades são compostas pelos grupos Nova Lima e Maquiné. E, na sequência seguinte, do Supergrupo Minas, Grupo Sabará, Grupo Itacolomi e Supergrupo Espinhaço, é possível identificar diversas formações e grupos que representam os depósitos minerais do Quadrilátero Ferrífero. O Supergrupo Minas (cf. Renger et al. 1994) inclui uma sucessão plataformal paleoproterozoica que detém três grupos de jazidas auríferas no Quadrilátero Ferrífero.

Depósitos Auríferos

Mina de ouro de Passagem, atualmente desativada,
aberta à visitação pública. Foto: Mário Cachão, retirada da CPRM.
Os depósitos de ouro do Brasil mais conhecidos estão associados, segundo a CPRM, principalmente ao Grupo Nova Lima, do Supergrupo Rio das Velhas. Esses corpos são, em geral, depósitos com sulfeto mineralizado com ouro, em zonas de cisalhamento acompanhado de alteração hidrotermal. Segundo o Glossário Geológico da CPRM, a alteração hidrotermal é a "alteração de minerais e rochas pela reação de água hidrotermal com as fases sólidas desses minerais e rochas". Assim, a água atua num processo metassomático, como "fluido fortemente aquecido e sob alta pressão, frequentemente no estado supercrítico, provocando a hidratação e/ou lixiviação de minerais silicáticos, oxidação de sulfetos, aporte de cátions metálicos,.. entre outros processos" (Winge, M). É desse modo que ocorre a concentração de minerais de interesse econômico, como o ouro. Esse tipo de formação de mineralização já foi apresentada no artigo da série Mineração: Noções Básicas, do Sobre Geologia, "Tipos de Depósitos Minerais".

Foto de ouro em veios de quartzo das minas Engenho d’Água e Catita, região do Quadrilátero Ferrífero. Fotos: Recursos Minerais de Minas Gerais - RMMG

Depósitos Ferríferos

Quanto aos depósitos de ferro, o Quadrilátero Ferrífero abriga tipos de depósitos muito característicos, os itabiritos — os maiores associados à Formação Cauê, Grupo Itabira, como o Águas Claras, Alegria, Capanema, Cauê, etc, com teor de ferro variando de 50% a 65%. Além disso, também apresentam os depósitos tipo hematita filitos, Fe – dolomitos e, subordinadamente, filitos piritosos.
O Grupo Itabira é uma sequência de característica predominantemente marinha, de ambiente raso a profundo, e os depósitos de itabiritos se acumulam mais pela base, na Formação Cauê — onde ocorrem as formações ferríferas de maior espessura dentro do Supergrupo Minas, variando de 200m até 300m. Esse grupo é constituído por itabiritos, dolomitos e, subordinadamente, metapelitos. (Rosière & Chemale Jr, 2000). Esses famosos depósitos, chamados itabiritos, são as conhecidas Formações Ferríferas Bandadas (Banded Iron Formations - BIFs).
Essas formações se caracterizam como: "Rocha sedimentar ou metassedimentar química ou vulcanoquímica finamente estratificada, apresentando camadas  de óxidos, carbonatos ou silicatos de ferro ritmicamente alternadas com camadas diferenciadas destas (quartzosas, anfibólicas, quartzo cloríticas,. .)", segundo o Glossário Geológico da CPRM (Winge, M, 2018). Segundo Piacentini et al (2007), é de consenso geral que a maior concentração deste tipo de deposição situa-se entre unidades arqueanas e paleoproterozoicas, sem ocorrência após 1,8 G.a, com exceção dos depósitos do final do Neoproterozoico. 
No caso dos itabiritos da Formação Cauê, a deposição ocorreu, principalmente, entre 2600 e 1800 Ma, correspondendo a aproximadamente 15% do volume total das rochas sedimentares do Proterozoico. Segundo Rosière & Chemale Jr (2000), os itabiritos são formações metamorfizadas, deformadas e oxidadas. Seus estratos são, predominantemente, de hematita como o óxido de ferro (em diferentes formas), e quartzo, dolomita e anfibólios como minerais de ganga.

Itabiritos dobrados da Formação Cauê,  na Serra da Piedade. Foto: Virginio Mantesso Neto.

Impactos Ambientais

Da mesma forma que a mineração no Quadrilátero Ferrífero ajudam a impulsionar a economia do estado de Minas Gerais, bem como a economia brasileira, uma área tão consumida pelas atividades minerárias recebe os impactos ambientais associados diariamente. Com a mineração avançando cada vez mais perto de áreas residenciais, a poluição e ruído causam cada vez mais impacto nas populações — e, mais que isso, as áreas desmatadas e com retirada do solo para extração das rochas perdem fauna e flora, além de riscos de contaminação de aquíferos e rios.
Por exemplo, segundo Silva & Souza (2012):
A questão ambiental, em Itabira, tomou proporções alarmantes pela degradação da paisagem, poluição de toda ordem decorrentes do modelo de desenvolvimento baseado na atividade extrativa mineral, por cerca de sessenta anos, envolvendo questões tanto relativas ao quadro natural, quanto aos aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais. 
Ainda seguindo leis ambientais, atividades minerárias de grande porte, como são as grandes minas de metais que se encontram na província do Quadrilátero, sempre acabam causando impactos. Por essa razão, a recuperação da área minerada não é menos importante que sua prospecção e beneficiamento, e deve ser bem planejada, regulada e aprovada pelo órgão ambiental responsável com antecedência — como discutido no artigo da sério #Geologia Ambiental, aqui no Sobre Geologia, no artigo "Recuperação de áreas degradadas". Quanto maior o empreendimento, maior também deve ser o cuidado com problemas ambientais.

Mapa da expansão da mineração no estado de Minas Gerais durante desde os anos 1980 até 2014. Figura: REZENDE, Vanessa Leite, 2016

Conclusão

A região do Quadrilátero Ferrífero, no estado de Minas Gerais, é uma das províncias minerais de maior importância para o país. Diversos estudos são feitos sobre sua geologia há anos, desde sua participação no ciclo do ouro — e são feitos até hoje. Com seus 7000 km² de área e formato curioso, o Quadrilátero e sua geologia representam uma parcela significativa das atividades minerárias do Brasil, bem como produção de muito do nosso minério de ferro, ouro, etc. Por essa razão, é de extrema importância continuar buscando, produzindo e estudando mais sobre essa província.


Referências Bibliográficas


Artigo escrito por Isabela Rosario

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