Cadeias de montanhas são estruturas muito conhecidas, suas paisagens
são exploradas por séries, filmes e livros. Mas o que pouca gente sabe é que
sua formação é extremamente relacionada com outra belíssima estrutura: as
dobras. Um exemplo são os Alpes europeus, as suas montanhas tem a formação
relacionada a dobras e seu cenário
invernal é até representada na embalagem do chocolate brasileiro “Alpino”. O
artigo de hoje trata das dobras e dos relevos derivados delas, incluindo
detalhamento da gênese de ambos.

Dobra em rochas carbonáticas, localizada no País
Basco. Foto por: Thibault Cavailhes
Dobras são deformações que ocorrem frequentemente na superfície
terrestre por conta do movimento das placas tectônicas, o que pode gerar
cordilheiras. Essas formações, com o tempo, sofrem com os processos exógenos
(processos que ocorrem na superfície terrestre, relacionados a fatores como o
clima, como, por exemplo, a erosão) e evoluem tornando-se relevos com
características muito específicas. Esses relevos variam muito de acordo com o
tipo de dobramento que ocorreu e as características do ambiente onde ele se
encontra. Alguns tipos de relevo podem ocorrer em diversas partes do mundo,
seguindo um padrão de evolução, outros podem ter características tão
específicas que serão exclusivos de alguns lugares.
Dobras
Dobras são formadas em rochas sedimentares, ígneas ou metamórficas
principalmente por tectonismo em regiões de convergência de placas tectônicas.
As forças compressivas agem nas rochas já formadas que se encontram em grandes
profundidades da crosta em condições de altas pressões e temperaturas, o que
explica a deformação dúctil, já que as condições superficiais não poderiam
propiciar essa característica plástica do material rochoso. Então, essa
superfície anteriormente plana da rocha, que pode ser, por exemplo, um
acamamento sedimentar ou uma foliação metamórfica, forma ondulações
características desse tipo de estrutura.
Os elementos da dobra são muito importantes para a compreensão dessas
estruturas, os principais são:
- Antiforme: dobra com convexidade voltada para cima;
- Sinforme: dobra com convexidade voltada para baixo;
- Anticlinal: dobra que apresenta a camada mais antiga na sua parte interna;
- Sinclinal: dobra que apresenta a camada mais nova na sua parte interna;
- Linha de charneira: representa a união dos pontos de curvatura máxima de uma dobra;
- Plano axial: divide a dobra pela metade passando pela linha de charneira;
- Flancos: superfícies onduladas que se encontram entre as charneiras de uma anticlinal e de uma sinclinal.
OBS: Antiforme não é um sinônimo de anticlinal, assim como sinforme não
é sinônimo de sinclinal, porém normalmente os antiformes são anticlinais e os
sinformes são sinclinais.
Elementos de uma dobra.
Autor da imagem desconhecido.
As dobras são classificadas de várias formas, com base no plano axial
podemos dividi-las em:
Tipos de dobra com base no plano axial. Autor da
imagem desconhecido.
Relevos
Ao sofrerem intemperismo e erosão, as dobras podem formar relevos
característicos como o Jurássico, Apalacheano e Alpino. A variedade de relevos
existentes deriva de diferentes fatores: resistência dos diversos materiais da
dobra, estilo de dobramento e intensidade do intemperismo.
●
Relevo Jurássico
O nome desse relevo deriva da região de Jura, na França, onde está localizada
a cadeia de montanhas Jura. A cadeia, por sua vez, tem seu nome derivado do
período Jurássico, quando suas montanhas foram formadas. Ela está localizada na
fronteira entre a França e a Suíça, ao norte dos Alpes.
Esse tipo de relevo é o primeiro estágio do relevo em dobras, ele é
formado em uma sucessão de dobras simples onde a erosão ainda não atacou tanto
as rochas, preservando a estrutura original das dobras.
A evolução desse relevo ocorre da seguinte forma:
- A erosão
dos flancos das antiformes que forma pequenos vales chamados de ruz;
- À medida
que esses vales vão se alargando, abre-se um cluse que é a passagem de um rio através do mont (topo da antiforme);
- Ocorre um ravinamento do cluse no antiforme, e o topo dele é
erodido (chamado de combe);
- A combe continua sendo erodida o que faz com que ocorra uma inversão do relevo, fazendo as sinclinais se tornarem topo e as anticlinais vale (justamente por conta da erosão da combe)
- Com a continuação dos processos erosivos,
a tendência é a pediplanação, ou seja, a planificação do relevo, porém,
com a continuação da erosão diferencial, o relevo pode evoluir se tornando
Apalacheano, que será posteriormente detalhado.
Evolução do relevo jurássico. Autor da imagem desconhecido.
Além da cadeia de montanhas Jura outro exemplo desse tipo de relevo é a
região de Niquelândia no estado brasileiro de Goiás. Nessa região o anticlinal
está arrasado e é composto por metassiltitos e gret (camada dura do flanco voltada para o mont) de quartzito da formação Traíras do Grupo Araí, enquanto isso
as sinclinais estão suspensas, elas são mantidas pelo quartzito e cobertas por
siltitos feldspáticos e arenitos do grupo Paranoá.
Relevo Jurássico em
Niquelândia. Autor da imagem desconhecido.
Os seguintes nomes citados acima: ruz,
cluse, mont, combe e gret são
exclusivos desse tipo de relevo e possuem sua origem na língua francesa.
●
Relevo Apalacheano
O relevo do tipo Apalacheano tem esse nome derivado dos montes
Apalaches que estão localizados no leste da América do Norte, desde o Alabama
nos Estados Unidos até a região de Terra Nova e Labrador no Canadá. Ele é a
segunda (e última) fase da evolução do relevo em estruturas dobradas, outros tipos
de relevos formados nessas estruturas, como o alpino, são formados em situações
muito específicas por isso são próprios de alguns lugares e não fazem parte da
evolução que os relevos em dobras normalmente apresentam.
Visão de satélite dos
Montes Apalaches. Foto por: Nasa.
Para que o relevo apalacheano possa ocorrer existem algumas condições:
o relevo deve estar aplainado (ou seja, já ocorreu todo o processo de evolução
do relevo jurássico), as camadas devem ser heterogêneas (algumas mais duras e
outras que são mais facilmente erodidas), consequentemente, paralelas umas às
outras e deve ocorrer algum tipo de evento tectônico de soerguimento para que a
erosão diferencial volte a ocorrer.
No final da evolução o relevo não irá refletir mais a estrutura da
dobra e sim as características próprias das litologias, sendo as cristas
derivadas das rochas mais resistentes e os vales das rochas menos resistentes,
independente se antes estavam em sinformes ou antiformes.
Essa evolução ocorre em algumas etapas:
- Com o
relevo já plano há a formação de drenagem que flui sobre as camadas de
diferentes litologias de rochas;
- Esses rios
passam a escavar as rochas menos resistentes formando vales paralelos, em
que as cristas são formadas pelas rochas mais resistentes e os vales pelas
menos resistentes.
Além dos próprios montes apalaches pode-se citar como exemplo a
popularmente conhecida como Serra Grande que se localiza em Alvorada, cidade do
estado brasileiro do Tocantins. As litologias do local fazem parte do grupo
Araxá onde os quartzitos (rochas mais resistentes) compõem as cristas e os
xistos (rochas menos resistentes) compõem os vales.
Relevo apalacheano em
Alvorada-TO. Autor da imagem desconhecido.
●
Relevo Alpino
A cordilheira dos Alpes se localiza na Europa, os países em que ela
está localizada são Suíça, Itália, França, Alemanha, Liechtenstein, Áustria e
Eslovénia. Sua extensão é de 1.200 km e a largura está entre 50 e 300 km.
Sua formação começou com a pressão exercida nos sedimentos do mar Tétis
pelas placas tectônicas africana e euroasiática, esse mar se localizava entre
as duas placas e deixou de existir após isso. Essa atividade tectônica criou
uma grande dobra recumbente e, posteriormente, falhas. A erosão e formação de
vertentes ocorrem principalmente pela ação de geleiras.
Para preservar a área tão rica tanto culturalmente, quanto naturalmente
a Convenção Alpina foi assinada pelos países europeus que a possuem em seu
território em 1991.
Região dos Alpes conhecida como “Helvetic
Nappes” localizada na Suíça. Foto por: Kurt Stüwe.
Conclusão
Dobras são estruturas geológicas muito interessantes e a geomorfologia
relacionada a elas é presente em diversas partes do mundo. Estudar e entender
sobre o relevo em que vivemos pode nos ajudar a compreender melhor como ele
funciona. Os relevos citados no texto formaram-se durante milhões de anos por
conta de muitas condições específicas para que isso acontecesse. Isso demonstra
como a passagem do ser-humano é pequena perto de tudo que a Terra já vivenciou.
Referências
http://www.funape.org.br/geomorfologia/cap2/index.php#titulo2.2.1.2c Acessado em: 02/03/2018
http://www.cesadufs.com.br/ORBI/public/uploadCatalago/15502016022012Geomorfologia_Estrutural_Aula_8.pdf
Acessado em: 02/03/2018
http://www.neotectonica.ufpr.br/aula-geologia/aula10.pdf
Acessado em: 02/03/2018
http://www.neotectonica.ufpr.br/aula-geologia/aula8.pdf
Acessado em: 02/03/2018
http://www.fgel.uerj.br/dgrg/webdgrg/disciplinas/estrutural/dobras.pdf
Acessado em: 02/03/2018
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/3291666/mod_resource/content/1/AULA%2004.pdf
Acessado em: 02/03/2018
https://www.suapesquisa.com/geografia/montes_apalaches.htm
Acessado em: 02/03/2018
https://pt.wikipedia.org/wiki/Conven%C3%A7%C3%A3o_Alpina
Acessado em: 05/03/2018
https://en.wikipedia.org/wiki/Geology_of_the_Alps Acessado
em: 05/03/2018
http://www.geologyin.com/2016/09/10-amazing-geological-folds-you-should.html
Acessado em: 06/03/2018
https://www.myswitzerland.com/en/jura-heights-and-alpine-views.html
Acessado em: 06/03/2018
http://www.geologyin.com/2015/09/how-geologists-determined-way-that.html
Acessado em: 06/03/2018
Material do professor José Martin Ucha: Geomorfologia -
capítulo 5: dobras, domos e falhas X Relevo
TORRES, Fillipe Tamiozzo Pereira. Introdução à geomorfologia. São Paulo: Cengage Learning, 2012.
GUERRA, Antonio José Teixeira; CUNHA, Sandra Baptista da. Geomorfologia: Uma Atualização de Bases e
Conceitos. 10a edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.
TEIXEIRA, Wilson; FAIRCHILD, Thomas Rich; TOLEDO, M. Cristina Motta de;
TAIOLI, Fábio. Decifrando a Terra. 2a
edição. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2009.
Artigo escrito por Isabel Schulz e Revisado por Isabela Rosario.
Muito bom artigo. Parabéns a quem escreveu!
ResponderExcluir[COMENTÁRIO DO ADMINISTRADOR] Agradecemos pela sua opinião! Ela muito valioso para os escritores do SG!
ExcluirBelo texto! Muito informativo e interessante!
ResponderExcluir[COMENTÁRIO DO ADMINISTRADOR] Agradecemos pelo seu retorno, é de grande valia para os escritores do SG!
ExcluirÉ um texto demasiadamente bom que demonstra uma grande habilidade de escrita da autora.
ResponderExcluir[COMENTÁRIO DO ADMINISTRADOR] Agradecemos pelo seu feedback, Eliud!
ExcluirAmei esse artigo. Foi tudo o que meu professor explicou na aula, continue assim.
ResponderExcluirmuito bom
ResponderExcluirEstou estudando sobre o assunto em Geomorfologia Estrutural, parabéns pelo artigo!
ResponderExcluirGeologia
ResponderExcluir