Espeleologia - Introdução - Sobre Geologia

17/09/2017

Espeleologia - Introdução

Você muito provavelmente já assistiu algum filme ou desenho animado que se passa dentro de uma caverna. Se tiver sorte, talvez já tenha até mesmo experienciado um tour por dentro desses túneis naturais! Entretanto, será que você sabe como se formam as cavernas? E as estalactites?
No artigo de hoje, falaremos sobre a ciência — e área associada à geologia — que trata da procura, observação e estudo, em geral, de cavernas e grutas. Está associada à gênese, compreensão do ambiente interno e externo e à constituição dessas formações, o que explicaremos brevemente hoje!


Paisagem típica de relevo cárstico. Foto por: Hugo Soria


O objeto da espeleologia é, em resumo, as cavernas, grutas e ambientes cársticos em geral. Dependendo da fonte, se encontrarão diversas definições de caverna, como muito acontece na ciência. Segundo a União Internacional de Espeleologia - UIS, por exemplo,  uma caverna seria  abertura natural formada em rocha abaixo da superfície do terreno, larga o suficiente para a entrada do homem. Apesar da última parte ser um tanto quanto muito focada do ser humano, podemos nos valer da essência dessa definição.
As cavernas (do latim cavus, buraco) são formações naturais que tendem a ocorrer nos chamado terrenos cársticos, constituídos por rochas de comportamento solúvel. Essas rochas são as do tipo carbonáticas, que possuem altas taxas de solubilidade química. Um dos exemplos mais comuns é o calcário, uma das rochas carbonáticas mais conhecidas e abundantes.

Quando a água penetra e percola as fissuras dessas rochas, acaba dissolvendo suas paredes e gerando aberturas cada vez maiores. Com o passar dos anos, essas fraturas se tornam grandes galerias — as cavernas que conhecemos. É por isso que, se você já foi numa caverna ou viu num filme, o chão é úmido e sempre vai ter um som de goteira ao fundo (principalmente num filme de terror!).
Agora, essa é a parte mais interessante: as rochas calcáreas são formadas, principalmente, de calcita (CaCO3), magnesita (MgCO3) e dolomita (CaMg(CO3)2), todos minerais carbonáticos. A água em si não é o suficiente para dissolver esses minerais. Entretanto, se a água torna-se ácido carbônico (ou seja, possui quantidades de dióxido de carbono), pode facilmente dissolver o carbonato de cálcio (CaCO3). A água pode se enriquecer em CO2 o assimilando da atmosfera ou de raízes de vegetais e material orgânico em decomposição.
Depois dessas grandes galerias serem formadas, a água acaba enriquecida em (bi)carbonato de cálcio, como a rocha dissolve sua composição nela.

Pra quem entende de química, essa é a reação da dissolução das rochas ricas em carbonato de cálcio. O resultado é água enriquecida em bicarbonato de cálcio.

Lembra do gotejamento? Com o passar do tempo, começa a haver recristalização da água enriquecida em carbonato de cálcio. Ou seja: volta a ser rocha. Isso te lembra alguma forma característica de cavernas? Algo com formato de gota, ou cone, que pende dos tetos das galerias naturais?
Isso mesmo: estalactites!

Estalactites na Gruta da Lagoa Azul, em Bonito, Mato Grosso do Sul. Foto por: Valdiney Pimenta

Esse processo de gotejamento que gera as estalactites pode levar milhares de anos — porém, não para por aí. As gotas que caem das estalactites e caem no chão das cavernas também precipitam, formando estruturas muito semelhantes às primeiras: estalagmites. Em formato, são idênticas! A diferença é que as estalagmites vão do chão para o teto, ao contrário das estalactites! Se as duas crescem demais, acabam por se juntas e formar colunas.
Todas essas estruturas (e mais várias outras) são chamadas de espeleotemas, definidas como estruturas rochosas originadas da dissolução e recristalização em níveis inferiores do teto, paredes e chão das cavernas.


Estalactites, estalgmites, colunas... E muitos outros espeleotemas! Foto: Domínio Público


As cavernas mais incríveis do mundo

Segundo a UNESCO, o mais extenso sistema de cavernas e passagens subterrâneas do mundo está localizado no Parque Nacional Mammoth Cave, Kentucky, EUA. O parque e sua rede subterrânea abrigam fauna e flora diversas, incluindo espécies que só existem lá, somando um total de mais de 130 espécies específicas do ambiente de cavernas, e mais milhares. Além disso, apresenta praticamente todo tipo de espeleotema conhecido. Atualmente, o sistema tem 400 milhas (644 km, aproximadamente!!!) de extensão traçados e medidos. O parque é patrimônio mundial da UNESCO desde outubro de 1981.

Interior da caverna Mammoth. Foto por: U.S. National Park Service

Outra caverna impressionante é a Hang Son Doong, que faz parte do Parque Nacional Phong Nha-ke Bang, no Vietnã. Alguns a consideram a maior caverna do mundo, embora seu fim nunca tenha sido encontrado. Segundo o jornal BBC, a caverna havia sido usada como abrigo contra bombardeios americanos durante a Guerra do Vietnã, e foi redescoberta em 2009, por exploradores da Associação Britânica de Pesquisadores de Cavernas.
Durante as expedições, os explorares encontraram estalagmites de mais de 70m de altura, e o teto chega até a 140m de altura em algumas partes. Carsten Peter, que acompanhou as expedições, chegou até mesmo a encontrar uma floresta escondida dentro da caverna.


Hang Son Doong e seus espeleotemas incríveis! Foto por: Carsten Peter/National Geographic Stock


No Brasil, também temos exemplos de cavernas incríveis, que chamam atenção tanto de geólogos quanto de turistas. Como, por exemplo, a Caverna do Diabo, no Parque Estadual Caverna do Diabo, na cidade de Eldorado, SP. A caverna possui mais de 6.000m de extensão, mas com apenas 600m abertos à visitação.
Atualmente, o Cadastro Nacional de Cavernas - CNE, criado pela Sociedade Brasileira de Espeleologia - SBE, possui 6511 cavernas registradas no Brasil. O estado brasileiro com o maior número de cavernas registradas é Minas Gerais, com 2.030 cavernas.
Ainda segundo o CNE, a maior caverna do Brasil está localizada na Bahia, no município de Campo Formoso. A Toca da Boa Vista é também considerada a maior caverna do hemisfério sul, com 107km de extensão, a 550km da capital do estado, Salvador. Além disso, a galeria é vizinha de várias outras cavernas representativas, como a Toca da Barriguda.

Toca da Boa Vista, na Bahia. Foto por: Daniel Menin

Legislação Ambiental

Ambientes como o patrimônio espeleológico representam uma riqueza natural muito grande. Sua formação leva milhares de anos, e abriga um ecossistema diverso e único, além de recursos minerais , fósseis e uma paisagem intrigante. Um recurso natural tão único deve ser protegido por lei. Apenas a presença de seres humanos dentro de uma caverna, por exemplo, pode interromper a formação de espeleotemas.
Na Constituição Federal Brasileira de 1988, no inciso X do artigo 20, declara-se como bem da União as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos. Em outubro de 1990, com o decreto 99.556, foi instaurada uma das primeiras leis de proteção e conservação do patrimônio espeleológico brasileiro. Entretanto, a lei foi alterada pelo decreto 6.640 de 2008.
Nesse decreto, se estabelece que as cavidades naturais subterrâneas existentes no território nacional deverão ser protegidas, de modo a permitir estudos e pesquisas de ordem técnico-científica, bem como atividades de cunho espeleológico, étnico-cultural, turístico, recreativo e educativo.
Segundo declaração nº 347 do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, em 10 de setembro de 2004, ficou instituído o Cadastro Nacional de Informações Espeleológicas - CANIE, organizado pelo IBAMA, que é constituído por informações relacionadas ao patrimônio espeleológico brasileiro.
Essa declaração estabeleceu, para fins de proteção ambiental das cavidades naturais subterrâneas, os procedimentos de uso e exploração do patrimônio espeleológico nacional (art 1º). Além disso, todos os órgãos ambientais competentes deverão repassar ao CANIE as informações espeleológicas inseridas nos processos de legislação ambiental, fazendo dele um grande banco de dados. Ou seja, se quer informações sobre regiões espeleológicas, é bom conferir no CANIE!

Conclusão

O patrimônio espeleológico é mais do que apenas uma vista bonita, e uma atração turística. A importância dessas formações é representativa em diversas ciências, com o a geologia, geomorfologia e biologia, sendo um abrigo de espécies específicas — e em perigo de extinção. As formas intricadas dentro das cavernas, e as grandes grutas e galerias naturais que vemos nos filmes, tudo isso leva milhares (ou milhões) de anos para serem formadas.
Seja por ser uma representação de um ecossistema, uma estrutura geológica ou um cenário de filmes de exploração, os espeleotemas devem ser protegidos por lei — e cuidados por cada um de nós. Nunca devemos esquecer o lema da espeleologia: "De uma caverna nada se tira a não ser fotografias, nada se deixa a não ser pegadas e nada se mata a não ser o tempo"!


Se interessou pelos espeleotemas?
Alerta de spoiler: teremos mais artigos sobre o tema!


Referências


  • http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=452, acessado em 08 de setembro de 2017
  • http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99556.htm, acessado em 08 de setembro de 2017
  • http://www.icmbio.gov.br/cecav/canie.html, acessado em 08 de setembro de 2017
  • http://www.cprm.gov.br/publique/Redes-Institucionais/Rede-de-Bibliotecas---Rede-Ametista/Canal-Escola/Espeleologia%3A-o-estudo-das-cavernas-1278.html, acessado em 16 de setembro de 2017
  • http://whc.unesco.org/en/list/150, acessado em 16 de setembro de 2017
  • https://www.nps.gov/maca/index.htm, acessado em 16 de setembro de 2017
  • http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2011/08/110810_galeria_caverna_vietna_cc, acessado em 16 de setembro de 2017
  • http://fflorestal.sp.gov.br/2015/10/29/visite-os-parques-estaduais-e-conheca-suas-cavernas-no-dia-da-espeleologia/, acessado em 16 de setembro de 2017
  • http://cnc.cavernas.org.br/cnc/Default.aspx, acessado em 16 de setembro de 2017
  • http://www.sbe.com.br/sociedade_regimento.asp, acessado em 17 de setembro de 2017

Esse artigo foi escrito e editado por Isabela Rosario.